quinta-feira, 30 de abril de 2009


Ela andava pelo meio da multidão. O casaco pesado mantinha-a aquecida, a gola levanta escondia os fones que abafavam os barulhos da cidade. Mesmo com a música no volume máximo, ela sentia o salto das suas botas baterem no concreto da calçada escondida embaixo daquele mar de pés. Na sua cabeça uma lista do que faria naquele dia se repetia, todos os horários e compromissos. Estava tão concentrada que não percebeu o homem que vinha em sua direção.
Os dois bateram de frente, ela teria caído de costas se não tivesse sido impedida pelas mãos dele. Sua baixa estatura a obrigava a olhar para cima, na tentativa que identificar com quem ela havia se batido. Olhos amendoados encontraram negros, que se destacavam na pele branca.
- Desculpa – Ela disse simplesmente, ainda atordoada pelo encontrão. Uma sensação de reconhecimento atravessava seu ser, era como se ela o conhecesse de muito tempo, como se ele fosse uma parte muito importante da sua vida.
Antes que ela tivesse a chance de fazer falar qualquer coisa, as pessoas que estavam atrás começaram a empurrá-la, tirando-a dos braços dele e a impulsionando na direção oposta. Ela ainda olhou sobre o ombro, fixando como que a fogo a imagem que a acompanharia pelo resto da vida: Ele, parado no meio da multidão, como uma pedra resistindo à correnteza daquele mar de pessoas, seguindo-a com os olhos cor de carvão. Em sua mão estendida ele segurava com delicadeza a fita que minutos atrás impedia que o cabelo liso dela caísse sobre os olhos. Seus lábios se movimentavam, mas os fones impediam que ela ouvisse qualquer coisa além da música que tocava.
Mesmo que ela quisesse com todas as suas forças voltar até ele, pegar sua fita e tentar falar alguma coisa que a fizesse parecer uma pessoa normal, as pessoas a sua volta ditavam um fluxo contra o qual não conseguia lutar. Ela apenas se deixou levar, mesmo sabendo que aquela decisão havia mudado o rumo da sua vida.
Ele estava paralisado de surpresa. A portadora dos olhos com que ele havia sonhado durante semanas a fio acabara de se materializar na sua frente, como em um passe de mágica. O aperto que sempre sentia no peito quando acordava daqueles sonhos se repetia ainda mais forte, enquanto ele a via ser levada pela multidão para longe. No instante em que ela levantou a cabeça e seus olhos se encontraram, ele soube que aquele aperto que sentia era a dor de uma perda que ele nunca teria, um vazio que jamais seria completamente preenchido.
Ele continuo seguindo-a com o olhar até que ela se perdesse no meio da multidão. Apertou a fita entre os dedos e seguiu sem direção, mesmo que seu coração parecesse se fragmentar em mais pedaços a cada passo que ele dava para longe dela.
E assim eles viveram.
Ela conseguiu tudo que sempre sonhou: um emprego excelente, uma casa, uma família. Teve momentos felizes, outros tristes, mas nunca se esqueceu daqueles olhos. Levou consigo a lembrança daquele dia na memória, até que a mesma começasse a falar e a apagar, passando então aquele doce momento, que mais parecia uma cena de filme, para seus quadros, eternizando-o. Fez questão de esquecer o próprio nome antes de esquecer o seu único encontro com o homem da sua vida. Seus familiares sempre se perguntavam a cauda da sua fixação por aqueles olhos. E ela sempre respondia que eles representavam o que ela nunca viveu, mas também nunca esqueceu ou deixou de desejar.
Ele também viveu uma vida próspera, suas canções sobre uma certa mulher de olhos amendoados ganharam fama, lhe dando a oportunidade de conhecer diversos lugares e milhares de pessoas. Muitas mulheres passaram pela sua vida, mas nenhuma conseguiu se manter ao seu lado por mais de uns poucos meses. Ele nunca dedicou uma música sequer a nenhuma pessoa que não fosse ela, a mulher da sua vida. Foi enterrado com a fita, agora gasta de tanto ser alisada e manipulada, junto ao peito, como uma forma silenciosa de gritar a todos quem foi seu verdadeiro amor.
Eles podem ter seguido vidas separadas, mas nunca se esqueceram do dia em que cruzaram com o destino.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

estrelas.


“ O céu parecia um macio veludo negro, cravejado de estrelas que brilhavam como diamantes aos olhos cor de âmbar do rapaz, que estava deitado no terraço da sua casa. Mas seus pensamentos estavam a milhares de quilômetros dali, seguindo os passos da bela menina de cabelos anormalmente vermelhos e olhos de vivo azul que havia roubado seu coração.”

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Esse textinho foi resultado de uma conversa no msn com umas amigas minhas. Muitas vezes elas são minha fonte de inspiração.

MCF, amo vocês S2


domingo, 5 de abril de 2009

amizade.

O painel que registrava os vôos dizia que o dela estava confirmado. Yasmin conheceria a sua amiga tão querida em alguns minutos. Esse pensamento fazia com que ela sentisse um frio na barriga, o momento tão esperado de poder abraçá-la de verdade, demonstrar todo o carinho que ela sentia pela amiga havia chegado.
-Vôo 2859, de Maceió para Salvador, desembarque no portão 1 – Yasmin, que já andava de um lado para o outro no saguão principal do aeroporto, saio correndo em direção do portão citado no alto falante.
Toda a extensão da grade que separa a sala de desembarque do salão principal estava tomada por pais, irmão, namorados, que esperavam seus entes queridos descerem do avião e saírem pela porta automática para matar as saudades que faziam seus corações se apertarem no peito.
Attie já estava impaciente dentro do avião. Depois de dez minutos de vôo ela já se agitava na cadeira. Nem sua música preferida, que tocava no ipod, nem o livro que ela tentava ler conseguiam prender sua atenção. A emoção daquele encontro a deixava mais inquieta do que o normal.
- A senhorita esta bem? – perguntou a comissária de bordo, que já estava agoniada com a inquietude da menina.
- Claro, moça, esta tudo bem – ela respondeu sorrindo – só estou com saudade das minhas facas, eu não pude trazer elas comigo – seu sorriso se alargou ainda mais quando viu a comissária sair de perto dela praticamente correndo. Seu lado sádico sempre falava mais alto nesses momentos.
- Senhores passageiros, nosso pouso foi autorizado e acontecera dentro de minutos, por favor apertem os cintos e deixem seus acentos na posição vertical – Attie ouviu o piloto falar, seu coração pulava em seu peito como se tentasse sair pela boca.
Quando a porta do avião abriu, ela foi a primeira a se levantar e, praticamente correndo, ir em direção a esteira de bagagens, procurando no meio de todas aquelas malas a sua que, diferente da maioria, era laranja.
Yasmin já estava ficando mais nervosa do que quando chegou ao aeroporto. Será que ela tinha perdido o vôo? Ou alguma coisa mais grave aconteceu? Perguntas pulavam na sua cabeça enquanto seus olhos varriam a multidão que saia da sala de desembarque. No meio de toda aquela gente ela conseguiu identificar uma baixinha arrastando uma mala laranja que provavelmente era maior que ela enquanto procurava alguém pela multidão.
- Xuxu! – Yasmin gritou, tentando a todo custo chamar a atenção da amiga que, ao ouvir o chamado, virou o rosto em sua direção.
- Abobora! – Attie largou suas coisas no meio do caminho e foi correndo em direção a amiga, que era inconfundível com sua aura de cachos dourados ao redor do rosto.
Aquilo parecia a cena de algum filme, as duas correndo pelo meio daquele mundo de pessoas alheias aquilo tudo. Elas corriam como se aquela pequena distancia que as separava lhes infligisse uma dor terrível, que só seria sanada com a aproximação das duas.
Elas se encontraram no meio do caminho, uma de frente para a outra, se encarando. As duas tinham um enorme sorriso no rosto.
- Até que enfim, em? – Yasmin disse tentando segurar a gostosa risada de alegria que crescia na sua garganta – Achei que você tinha sido presa por porte ilegal de armas no aeroporto.
- Você não imagina o quão negligente eles são quando se trata disso – Attie respondeu, sem conseguir conter o riso.
Como se tivessem combinado, as duas avançaram ao mesmo tempo, se abraçando, Yasmin levantou Attie do chão, o que provocou risos nas pessoas que assistiam a cena. Elas se separaram, ainda rindo.
- Mas e ai – Começou Attie - Quando você vai me apresentar seus livros para eu poder escolher quais eu vou roubar pra mim?
- Eu até posso te apresentar eles, mas todos vão continuar na minha estante – Yasmin disse, passando um braço pelos ombros de Attie.
- É o que veremos – respondeu Attie, dando uma gargalhada de psicopata que assustou a maioria das pessoas que prestavam atenção na conversa.
- Eu já disse que você é maluca? – Yasmin tropeçava nos próprios pés de tanto rir – Acho que vou te mandar para um hospício.
- Eu sei que você me ama, não precisa se declarar na frente de todo mundo – Attie respondeu, caindo na risada também.
As duas seguiram em direção a uma das saídas do aeroporto, abraçadas de uma forma engraçada por conta da diferença de altura e da enorme mala que mais parecia um elefante laranja. Ambas com o mesmo desejo em mente:
Que aquela amizade durasse um curto tempo chamado para sempre.

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